sábado, 17 de agosto de 2013

20130817 A Escola e eu

A Escola e eu


Eu sou o João, João Paulo, eu tenho 8 anos de idade, e estou aqui para contar para você como eu perdi o medo da escola.


Eu também acho, agora que tenho 8 anos, que ter medo da escola é besteira. Mas eu não achava isso quando eu tinha 5 anos.


A gente vivia brincando na rua, e meus amigos que eram mais velhos que eu, tinham 7 ou 8 anos já estavam na escola.


Eles sempre falavam da escola. Diziam que tinha lição para fazer, que a professora era brava, que ela queria ver o caderno toda hora, ...


Na frente da casa do Mário Rubens lá na Rua Pasteur no Gonzaga em Santos os mais velhos viviam falando aquele monte de coisas e eu ficava só olhando, ouvindo e pensando ...


Chegava a hora deles se preparar para a escola eu ficava sózinho, e ia para minha casa brincar com os gatos no porão. Mas sempre gostava de ver eles sair com o uniforme azul de gravata pendurada no pescoço.


Eles falavam coisas ruins da escola, mas eu queria ir, queria ver como é que era aquilo. Às vezes eu passava a tarde querendo saber se escola era bom ou era ruim.


_ Mãe, escola é ruim ?


_ Quem te disse isso meu filho, é lá que você vai saber como é a vida, a natureza, os números e um mundo de outras coisas.


_ Hamm.. Mas não é chato não ?


_ Filho, só tem um jeito para saber, é você ir lá. Falta pouco, o ano que vem você já começa.


À medida que o tempo passava eu ficava mais impaciente para ir para a escola.


No fim de tarde, quando eu esperava meus amigos voltarem da escola prá gente brincar, eu ficava olhando, prestando atenção : eles voltavam contentes, brincando um com o outro. Afinal não devia ser assim tão ruim.


A Escola


Um dia, no final da tarde, uma dessas tardes de sol quente, que nenhuma folha se move nas árvores, minha mãe e minha irmã chegam em casa cheias de pacotes. Tinham ido na cidade. Sabe o que tinha nos pacotes?


Todo o meu material da escola, uniforme azul com gravata de elástico e tudo. Eu fiquei muito contente. Não sabia se ia contar pros meus amigos ou se ficava olhando para aquilo um pouco mais.


Elas disseram que como eu queria muito, e elas também queriam que eu aprendesse muitas e muitas coisas. Tinham me matriculado na escola já que era fevereiro.


Dia seguinte saí para brincar bem cedo, me sentia melhor, ia com a turma para a escola. Como era aquilo ??? Eu ia saber afinal. Não via a hora de colocar o uniforme. No caminho para escola, pela Rua Tolentino Filgueiras junto com meus amigos eu ia brincando com com as cores preto e branco do calçamento e pensando com meus botões : “É bom”, “É ruim”, “É bom”, “É ruim” ...


Chegamos numa casa meio antiga, e a Arlete, uma moça magra e sorridente me dá a mão. Despedi dos meus amigos que cada um foi para a sua classe. Não sabia o que ia acontecer. Tinha um pouco de medo, mas a moça, segurando bem firme a minha mão disse :


_ Você vai começar uma vida nova agora.


Ainda sem entender muito, sorri para ela, que me beijou e me levou para apresentar D. Ana.


O primeiro dia


Sentado no meu lugar na sala de D. Ana fiquei olhando as paredes.


Eram paredes altas, de um azul bem clarinho, cheia de quadrinhos com o Pato Donald, Tio Patinhas, e um monte de outros personagens. Eu olhava as paredes, olhava o meu material e não acreditava que estava na escola.


Sabe! A D. Ana era uma pessoa legal. Era não, é, ela continua dando aula na escola, eu é que já estou em outra classe.


D. Ana tinha uma voz tranquila, mas não era uma dessas vozes “boca mole”, que a gente tem vontade de dormir. Não. Eu prestava atenção em cada palavra. Eu sabia. Eu tinha certeza que ela gostava de todos nós. Ela usava uma calça jeans e um camisão por cima.


Fiquei olhando, olhando ...


_ Bem, agora nós vamos fazer uma roda. É um jogo, o jogo do conhecimento.


A gente vai se apresentar dizendo o nome, o bairro onde mora, e três coisas que gosta de fazer fora da escola.


_ Hiii - eu pensei - tem que falar na frente de todo mundo.


_ Quem quer começar ?


Uma menina baixinha, de olho redondo como uma bola começou:


_ Sou Ana Paula, moro aqui perto no Gonzaga, e gosto de brincar de esconde-esconde, queimada, e ... hammm ... já sei, Mico.


A sala ficou quieta. Alguém mais teria que falar. Falei de vez para ficar livre : Sou João Paulo, moro na Rua Pasteur, no Gonzaga e gosto de bola, bicicleta e taco.


Respirei aliviado depois disso e fiquei prestando atenção na D. Ana. Ela olhava um por um da sala. Logo depois ...


_ Sou Mário, moro no Boqueirão e jogo bola, video game ... e ...basquete no clube.


A sala se calou novamente, e se a professora não empurrasse não saia nada. Ninguém mais falaria.


_ Quem mais tem lingua nesta sala? Quero ver. Todo mundo mostrou a lingua.


_ E por que só três falaram ? Pouco a pouco foi saindo :

_ Beto, Vila Belmiro, bicicleta, cachorro e bola.

_ Vanessa, Campo Grande, conversar com as amigas, queimada e bicicleta.

_ Pedro, José Menino, bicicleta ...


_ Que mais você gosta? - perguntou D. Ana.


_ Chi, professora não sei. Um passarinho passou bem na janela e pousou no fio do poste. Era bem pequeno, devia ser bem novinho. Pus toda minha atenção nele e esqueci do mundo.


_ E agora só falta você. Tomei um susto. Fiquei olhando o passarinho e varios colegas tinham falado. Tive vergonha e fiz de conta que nada tinha acontecido. Ainda bem, ela não perguntou nada prá gente do que os outros tinahm falado.


Fiquei olhando a professora meio desconfiado, mas estava tudo bem. Aquele sorriso gostoso andando ora dentro ora fora de nossa roda.


Na saida eu tinha combinado de esperar meus amigos.


Eles estavam demorando e eu estava ficando triste e com medo. Foi quando Arlete com seu sorriso tranquilo e jeito de menina me tranquilizou dizendo :


_ Você vai com seus amigos, não? Já viu eles no campo de futebol ? Eu, que nem sabia do campo de futebol fiquei de olho aberto.


_ Campo de futebol? Onde?


Ela, com a paci6encia que era sempre dela pos a mão na minha cabeça, dizendo não ter me mostrado a escola na entrada pois eu tinha chegado atrasado naquele primeiro dia.


_ Mas não foi culpa minha. Meio dia eu estava pronto. Eles é que atrasaram.


_ Muito bem. - disse ela - agora nós vamos ao campo de futrebol avisar seus amigos que você está comigo e vamos ver a escola toda.


E assim foi. Passamos num monte de salas: era sala de química, sala de biologia, sala de computador que eu queria brincar. Olha!


Tinha muita sala mesmo, e eu nem entendi tudo o que ela falou naquele dia. Mas enfim a escola estava vista.


Ouvi a voz dos meus amigos gritando gol lá embaixo. Falei que queria jogar e Dona Arlete me atendeu na hora.


Cheguei no campo e meus amigos já estavam pegando o material, se preparando para ir embora. Eu queria jogar. Por mais que tentasse não teve jeito. Um ia para o inglês, outro pro clube, voltei prá casa de mau humor.


_ Mas nem uma partidinha de 3 né!


Eles riram e quiseram apostar corrida. Na Tolentino, enquanto eu corria o vento batia no meu rosto e eu pensava : "Se for sempre assim, escola é legal”.


Segundo dia


Acordei contente, já pensando em jogar um pouco de bola de manhã, e matar a vontade de usar o campinho da escola no fim da tarde.


_ Não contei prá voce leitor sobre o campo. Preste atenção! É um campo de cimento liso, não muito grande, com as traves de ferro pintadas de preto. Hoje eu acho pequeno, mas naquele ano tava bom prá mim. Hoje eu jogo com o pessoal da rua na praia, e a gente faz a marcação do campo na praia bem grande. Tem dias que até os cara grandão vem querer jogar bola com a gente. Mas deixa eu contar daquele dia.

_ Então, eu acordei e já fui pensando em jogar na escola. Quando sai na rua não tinha ninguém. Sentei na porta de casa e fiquei pensando do que eu ia brincar.


Videogame é chato, mico precisa de alguém, dominó também.


Andei de bicicleta.


Tinha dado algumas voltas no quarteirão e o pessoal começou a aparecer. O primeiro foi o Mário Rubens que chegou com uma baita cara de sono. Trazia dois tacos, duas latas de óleo e uma bolinha velha de tenis. Queria jogar taco a todo custo. Faltavam dois. Chamar alguém era ruim, deviam estar dormindo.


Fizemos algum barulho com as latas. O pessoal começou a aparecer rapidinho, e foi taco até a hora do banho. Tinha três duplas, quem perdia caia fora.


Mais um dia de atividades


Já era o fim da tarde e o sinal não tocava. Na frente da sala um relógio desses que a gente tem na cozinha de casa dizia que eram quatro e meia, não aguentei:


_ Professora quando é que o sinal vai tocar? Parece que o sinal me ouviu perguntar, foi acabar de falar e ele tocou. Futebol
enfim. Saímos da escola suados de tanto jogar. Foram seis partidas de dez. Jogamos com o pessoal do quarto ano mas não ganhamos.



Na volta da escola, pela Avenida Ana Costa, íamos animados comentando os melhores lances.


Chegamos em casa. Ai. Chegamos em casa.


Quando entro em casa só vejo minha mãe com as mãos na cabeça.


Parece que eu não estava com uma cara muito boa. Segui para o meu banho calado, sob uma chuva de palavras de minha mãe.


Trancado no banheiro eu dei risada, afinal, ela nunca ia entender a alegria que a gente sente quando passa por um monte de gente, chuta, e a bola vai direto, bonitinha, deitar lá no cantinho da rede.


Banho tomado. Ânimos mais serenos na casa, boto um sorriso nos lábios e caminho para a cozinha dizendo :


_ Mãe, escola é bom. Ela, que ainda estava de cara feia, estampa um sorriso no rosto e, ainda enxugando as  mãos, me dá um abraço bem apertado.


Paulo Cesar Fernandes

17 08 2013

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