domingo, 27 de julho de 2014

20140727 Passagens PósCatólicas


Passagens PósCatólicas


Não podemos viver como réus, e não somos réus nesta vida. Somos sim protagonistas de construções presentes e pretéritas. Libertos já, dessas coisas asquerosas que as instituições nos fazem crer: pecado ou culpa.

Ponto final a tudo isso. Construções não condizentes com o tempo de liberdades construído a duras penas por gerações. Conservadores de todos os matizes sempre tentaram colocar empecilhos ao Carro da História. Inútil. Ele segue semovente a despeito de tudo e de todos.

O Movimento Espírita conta com diversos pastores de almas, encarnados e desencarnados a ditar regras, através das suas obras. Aplacam a dor de alguns; mas por outro lado, dada a ferocidade de suas certezas, trazem desequilíbrio e o peso da culpa a outros tantos.

Servem ou desservem à causa da Libertação do Espírito?

Cada qual busque sua resposta. Não a darei eu.

És capaz de um pensar autônomo e liberto? Espero que sim.

Não sou pastor, padre ou espírito guia. Sou apenas um homem que escreve.

Mesmo Allan Kardec em algumas passagens tem uma postura postulante do pecado, apesar do não uso da palavra, faz muito empenho em descrever os sofrimentos após a morte, dos espíritos cuja vida não foi exemplar. Isto pode não ser um inferno descrito por Dante, mas em muito se aproxima.

Para minha alegria homens como Jací Régis já falaram da forte presença Judaico-Cristã em nossas hostes, e no seio da literatura espírita. Não é de admirar assim, a aceitação intensa do espiritismo dentre os companheiros vindos da Igreja Católica. O pecado apenas mudou de nome e de configuração. Mas as penas futuras seguem apavorando os espíritos e os espíritas.

Essas pessoas apenas mudaram de Igreja.

Ao pensar o espiritismo partindo de outra ótica. Mais condizente com os tempos líquidos, tempos tecnológicos, e tempos laicos; tais formas de pensar, mesmo que postas por Kardec em suas obras, se tornam inaceitáveis. Aprisionam o espírito através do medo do futuro. Das “sombras do umbral” após a passagem para a imaterialidade.

No senso comum do Movimento Espírita temos a “Lei de Causa e Efeito”. Uma aberração lógica. Tal lei, se perfeitamente admissível no âmbito da física com a Terceira Lei de Newton; no concernente ao espírito e sua ética é completamente equivocada. Em que pese seu uso indiscriminado entre consagrados oradores e escritores espíritas do porte de Hermínio C. Miranda.

Prefiro me valer do pensamento do argentino Humberto Mariotti para a análise de tal conceito:

4) A Dialética Palingenésica do Kardecismo

 
O método kardecista baseia-se na dialética palingenésica do progresso e da evolução, enquanto o antigo espiritualismo se funda numa concepção fatalista, no que respeita à lei de causalidade ou de causas e efeitos. A dialética de Hegel é o grande instrumento com que se pode conhecer o fenômeno palingenésico, a que está sujeito o Ser em sua ascendente evolução. Além disso, é por meio da dialética que se poderá transformar a ideia de reencarnação, que nos vem do Oriente, em renascimento ou palingenesia dinâmica, para a civilização do Ocidente. Sem o método dialético e kardecista, a reencarnação continuará sendo um exotismo oriental, sem ligação nem entrosamento com o processo histórico. (pag. 68)
 
O espiritismo determina um novo destino para o Ser encarnado, não obstante a gravitação moral que a lei de causalidade exerça sobre o indivíduo. Por ser o cristianismo novamente revelado, lutará constantemente contra um mundo imperfeito e a rigidez mecânica da lei de causas e efeitos. Além disso, ao despertar no homem uma nova consciência sobre o bem e o mal, dará ao espírito um novo direito: o de libertar-se desses carmas cegos e inconscientes, pois todo destino inferior poderá ser modificado, quando o Ser reconheça sua natureza palingenésica. (pag. 106)

In “Humberto Mariotti . O Homem e a Sociedade numa Nova Civilização . PENSE”


Meus grifos no texto de Mariotti visam focar o quanto libertador é o espiritismo a partir da tomada de consciência do Ser. Não mais um espírito pecador e com coisas do passado a expiar, mas um Ser liberto e consciente de sua progressiva jornada no sentido de sua completude.

Somos seres incompletos, e apenas no processo palingenésico teremos oportunidades de revisão e reordenamento de nossos pensamentos e atos. Colocando-nos em patamares superiores de compreensão das leis Naturais.

Nada mais de “passado delituoso” a nos atormentar. Mesmo as deficiências físicas perdem o peso de algo passado e tem sua fonte na genética do presente. Deixam para trás as explicações metafísicas para pautar apenas em explicações científicas. E por vezes nas condições materiais e culturais de toda uma sociedade.

O CatoEspiritismo brasileiro muito tem a ver com as obras de Emmanuel e André Luis.

É difícil fazer tal afirmação, pois sei da força dada por essas obras ao soerguimento de muitas almas em desespero, abatidas pela dor da perda de entes queridos, e outras tantas situações na qual tal literatura tem o condão de trazer um lenitivo. Mas não podemos ser cegos ao impacto negativo de forjar o pensamento partindo dos romances de André Luis. Tomar aquilo como realidade totalizante. Isso é o problema de tal literatura. Se tomado um romance, como caso elucidativo apenas, é perfeitamente admissível. Mas fazer disso verdade irrefutável é distorção de compreensão de tudo relativo às Leis Naturais.

Leis muito mais flexíveis que nosso maniqueísta modo de pensar. Sim, é mais fácil pensar o mundo partindo de “esqueminhas” prontos e acabados. E viver dentro dessas armaduras medievais.

Mas nossos tempos não são mais os tempos medievais. Rasgam nosso cérebro através da neurociência, descobrindo segredos jamais imaginados pelos espíritos comunicantes de Kardec. Uma nova possibilidade se abre ao organismo físico e por consequência à expressão do espírito a esse organismo vinculado.

Vivemos uma fase de transição. E em toda fase de transição a ortodoxia é a pior companheira. Permitamos ao tempo e à ciência nos revelem mais e mais de nós mesmos. Nesse ínterim vivamos da melhor forma possível, fazendo bom uso do tempo e de toda liberdade trazida pela “Era do indivíduo”, tal como nos propõe Alain Renaut em sua obra assim intitulada.

Liberdade, responsabilidade e Vida em plenitude.

 

Paulo Cesar Fernandes

27 07 2014

 

 

 

sexta-feira, 25 de julho de 2014

20140724 Batalha Vital

Batalha Vital


Triste é a Vida quando a Morte se apresenta.
Vem sarcástica. Mas sem sorriso qualquer na fria face.
Pálida. Séria. Brutal. Irredutível.
Nos tenta arrebatar as forças e a alegria de viver.
Momentos sim. Momentos não.
Vivemos a oscilação das energias do corpo.
O corpo é forte. Mas nem tanto.
Tristes olhos falam muito.
Na linguagem do silêncio mais profundo.




Ela sonda a casa para se apoderar do corpo.
Expulsamos com toda nossa energia.
Suficiente ou não, afastamos dentro do possível.
A dor traz a poética?
Nada sei.
Recarrego e esvazio a cada etapa do dia.
Sonho avanços e vejo retrocessos.
Penso a cura e o coração palpita feliz.




Mas ela ronda e ronda a casa.



Paulo Cesar Fernandes

24  07  2014

quinta-feira, 24 de julho de 2014

20140724 Hegel_ Enciclopedia_Introducción


 

 

Georg Wilhelm Friedrich Hegel

 

Enciclopedia de las ciencias filosóficas en compendio

 

Para uso de sus clases

Edición, introducción y notas de Ramón Valls Plana

Alianza Editorial

 

Título original:

Enzyklopaedie der philosophischen Wissenschaften im Grundrisse

Hegel chamava de planos para uma Enciclopédia ...

 

 

Introducción

 

§1

 

La filosofía carece de la ventaja, que favorece a las otras ciencias, de poder suponer sus objetos como inmediatamente ofrecidos por la representación y [de poder suponer] como ya aceptado el método de conocimiento para empezar y proseguir [su discurso]. Pero también es cierto por de pronto que sus objetos los tiene en común con la religión. Ambas tienen la verdad por objeto y precisamente en el sentido más elevado [de esta palabra], a saber, en el sentido de que Dios es la verdad y él solo lo es.

 

Ambas tratan además de la región de lo finito, de la naturaleza y del espíritu humano, de su referencia mutua y de su referencia a Dios en cuanto verdad suya. La filosofía puede, por tanto, suponer desde luego una cierta

familiaridad con sus objetos; es más, debe suponer esa familiaridad, así como un cierto interés en aquellos objetos; y esto por la simple razón de que la conciencia se hace representaciones de los objetos antes (en el tiempo) de hacerse conceptos de ellos, hasta el punto de que el espíritu que piensa solamente pasando por el representar y aplicándose sobre él, avanza hasta el conocimiento pensante y el concebir.

 

§2

 

La filosofía puede determinarse, para empezar y en general, como contemplación pensante de los objetos. Si por otra parte es verdad (y se verá desde luego que lo es) que el ser humano se distingue del animal por el pensamiento, resulta entonces que lo humano es humano por ser causado por el pensamiento y sólo por esto. Sin embargo, siendo la filosofía un modo peculiar de pensar, un modo mediante el cual el pensar llega a ser conocer y precisamente conocimiento concipiente74, este pensar de la filosofía mantendrá una diversidad respecto de aquel pensar que actúa en todo lo humano, es decir, del que causa la humanidad de lo humano, por bien que siendo también [el pensar filosófico] un pensar idéntico a éste, hay en sí sólo un pensar. Esta distinción enlaza con que el haber humano de la conciencia, fundado por el pensar, no aparece en primer término bajo la forma del pensamiento, sino como sentimiento, intuición o representación, formas que hay que distinguir del pensamiento en cuanto forma.
 
 
 
 
 
Pretendo seguir com meu fichamento desta obra.
 
 
Paulo Cesar Fernandes
 
Julho de 2014

terça-feira, 22 de julho de 2014

20140722 Aqui e Agora da Arte

Aqui e Agora da Arte


Quando a doçura da música toma a minha casa, a minha mente, fazendo o mundo tão azul; assim tão azul, eu penso cá com meus botões como é primitiva e banal toda espécie de violência.


A Arte, com sua estética, cria uma cúpula por sobre nossa vida de tal forma que o ar é leve brisa a perpassar tudo num acalanto dos sonhos. Dos sonhos todos.


Assim é a vida com arte. E quanto tempo levei para chegar aqui.


Quanta estrada percorrida, quantas passadas demarcando a rota, sempre uma rota de firmes pisadas.


Tudo valeu! O passado é meu presente e meu futuro é agora.


Tudo está no Aqui e Agora da Arte.


Paulo Cesar Fernandes

22 07 2014

20140722 Mais do RS falo de Vitor Ramil

Vitor Ramil


Muito mais que uma voz e uma sensibilidade é uma ponte que se lança desde Pelotas aos paises platinos.

Tudo a ver com minha mais profunda Latinidad.

É por isso que sua arte me toca?

Por isso e por mais um caralhão de outras coisas não explanáveis nas breves palavras que os frios ventos platinos me trazem. Fora de tempo. Fora de esquadro. Fora do esquema.

Traz uma outra poética, nunca percebida por mim, tão santista que sou.

Este mais que seus irmãos me faz ver o quanto santista sou eu, e que identidades tem a minha cidade a serem descobertas além de se situar entre o monte e o mar.



Vitor Ramil é algo novo para mim. E por vezes sua voz me lembra a do velho e bom Caetano Veloso em suas obras mais doces.

Veja como é para ti o canto desse gaucho.



Trajetória

 

 

Anos 80

 

 

Compositor, cantor e escritor nascido em Pelotas, RS, em 7 de abril de 1962, Vitor Ramil começou sua carreira artística ainda adolescente, no começo dos anos 80. Membro de uma família de músicos - com dois irmãos também cantores, Kleiton e Kledir, e um primo músico, Pery Souza2 - aos 18 anos de idade gravou seu primeiro disco Estrela, Estrela, com a presença de músicos e arranjadores que voltaria a encontrar em trabalhos futuros, como Egberto Gismonti, Wagner Tiso e Luis Avellar, além de participações das cantoras Zizi Possi e Tetê Espíndola. Neste período Zizi gravou algumas canções de Vitor, e Gal Costa deu sua versão para Estrela, Estrela no disco Fantasia.

 

 

1984 foi o ano de A paixão de V segundo ele próprio. Com um elenco enorme de importantes músicos brasileiros, este disco experimental e polêmico, produzido por Kleiton e Kledir, seus irmãos mais velhos3 ,proporcionou ao público uma espécie de antevisão dos muitos caminhos que a inquietude levaria Vitor Ramil a percorrer futuramente. Eram vinte e duas canções cuja sonoridade ia da música medieval ao carnaval de rua, de orquestras completas a instrumentos de brinquedo, da eletrônica ao violão milongueiro. As letras misturavam regionalismo, poesia provençal, surrealismo e piadas. Deste disco a grande intérprete argentina Mercedes Sosa gravou a milonga Semeadura.

 

 

Em 1987, tendo trocado o sul do Brasil, Porto Alegre, pelo Rio de Janeiro, Vitor lançou Tango.

 

 

Diferentemente do disco anterior, este era o resultado do trabalho de um grupo pequeno de músicos a partir de um repertório também reduzido. Em oito canções o furor experimental e lúdico de antes cedeu lugar a letras densas e elaboradas de canções que viraram sucessos. O letrista se afirmava e o compositor tornava-se mais sutil, proporcionando aos músicos e grandes improvisadores como Nico Assumpção, Hélio Delmiro, Márcio Montarroyos, Leo Gandelman ou Carlos Bala perfomances marcantes.

 


Anos 90

 

 

Na passagem dos anos 80 para os 90 Vitor afastou-se dos estúdios e passou a dedicar-se ao palco, pois quase não fizera shows até então. Foi quando nasceu o personagem Barão de Satolep, um nobre pelotense pálido e corcunda, alter-ego do artista. Dividindo alguns espetáculos com esta figura ao mesmo tempo divertida e mal-humorada, mesclando música, poesia, humor e teatro, Vitor começava a consolidar seu público e a aperfeiçoar sua interpretação.

 

 

Neste período não só definiu-se a música e postura do Vitor Ramil dos discos que viriam a ser gravados na segunda metade dos anos 90 como apresentou-se o Vitor Ramil escritor, através da novela Pequod, ficção criada a partir de passagens da infância do autor, de sua relação com o pai, de suas andanças pelo extremo sul do Brasil e pelo Uruguai. A partir do lançamento deste primeiro livro, em 1995, de grande repercussão junto à crítica e recentemente lançado na França, o artista passou a ocupar-se duplamente: música e literatura.

 

 

Mas mais do que pela escritura de Pequod os anos 90 ficaram marcados para Vitor Ramil como os anos em que começou a refletir sobre sua identidade de sulista e sua própria criação através do que chamou de A estética do frio. A busca dessa “estética do frio” deu-lhe a convicção de que o Rio Grande do Sul não estava à margem do centro do Brasil, mas sim no centro de uma outra história. Neste momento, significativamente, ele deixava o Rio de Janeiro para voltar a viver no Sul.

 

 

Simultaneamente a Pequod aconteceu a gravação do cd À Beça. Tendo saído apenas como edição especial, em tiragem limitada, por uma revista de música de Porto Alegre, este disco representou seu primeiro esforço de realizar algo a partir das idéias da estética do frio. Com versos leves, cheios de coloquialidade, em melodias fluentes e inusitadas concepções rítmicas, o disco antecipava os dois próximos e mais importantes trabalhos: Ramilonga – A Estética do Frio e Tambong.

 

 

Em Ramilonga – A Estética do Frio Vitor inaugura as sete cidades da milonga (ritmo comum ao Rio Grande do Sul, Uruguai e Argentina): Rigor, Profundidade, Clareza, Concisão, Pureza, Leveza e Melancolia. Através delas a poesia de onze “ramilongas” percorre o imaginário regional gaúcho mesclando o linguajar gauchesco do homem do campo à fala coloquial dos centros urbanos. A reflexão acerca da identidade de quem vive no extremo sul do Brasil começa pela recusa ao estereótipo do gauchismo; o canto forte dá lugar a uma expressividade sofisticada e suave; instrumentos convencionais são substituídos por outros, como os indianos e africanos, nunca antes reunidos neste gênero de música. Pela contundência de suas idéias, pela originalidade de sua concepção, Ramilonga é uma espécie de marco zero na carreira de Vitor Ramil.

 


 

2000 e além

 

 

Tambong, seu trabalho seguinte, foi gravado em Buenos Aires, sob a produção de Pedro Aznar. Seu resultado é a confirmação da idéia de estar “no centro de uma outra história”, com a musicalidade e poesia brasileiras combinadas com as dos países do Prata a fluir naturalmente em quatorze temas cujos arranjos fazem deste um dos trabalhos mais originais da moderna música brasileira.

 

 

Tambong saiu em duas versões, português e espanhol. Para realizá-lo Vitor trabalhou com músicos argentinos, como o percussionista Santiago Vazquez, que o acompanha nos shows, e contou com a participação dos artistas brasileiros Egberto Gismonti, Lenine, Chico César e João Barone.

 

 

Os shows de lançamento de Tambong levaram para o palco a vibração ritmo|rítmica e as sutilezas harmônicas e melódicas do disco em meio a uma bela produção de luz e cenografia. Começaram com o espetáculo de abertura criado especialmente para o primeiro Fórum Social Mundial em Porto Alegre e, depois, foram readaptados para uma temporada de um mês no Rio de Janeiro e outra em São Paulo. Na Argentina o lançamento aconteceu em outubro de 2001, com dois espetáculos em Buenos Aires.

 

 

No ano de 2002, com sua banda brasileiro-argentina (Santiago Vazquez, percussão; píccolo bass e sitar; Roger Scarton, harmônio e guitarra) levou Tambong em turnê pelas principais capitais do Brasil.

 

 

Em 2003 Vitor apresentou seu primeiro show solo em Montevidéu, Uruguai, Sala Zitarrosa, mesmo local onde tocara, no final de 2002, com o compositor e intérprete uruguaio Jorge Drexler, hoje seu parceiro.

 

 

Ainda em 2003 apresentou-se com sua banda na Suíça, nas cidades de Genebra, Zurique e Schaffhouse. Em Genebra, no Teatro St. Gervais, Vitor deu uma conferência, tendo como tema “A estética do frio”. Em Paris, no mesmo período, participou do evento de lançamento da tradução para o francês de seu livro Pequod, pela editora L’Harmattan.

 

 

Além de seu livro Pequod, suas canções vem sendo distribuídas na Europa em coletâneas inglesas, espanholas e portuguesas. Sobre Vitor Ramil escreveu o produtor londrino John Armstrong: “Why hasn’t this genious dominated the world of music yet?” Algo como "Porque esse gênio ainda não domina o mundo da música?" em tradução livre.

 

 

Outubro de 2004 é a data de lançamento de Longes, seu sexto álbum, também gravado em Buenos Aires e produzido por Pedro Aznar. Neste trabalho Vitor Ramil aprofunda e aperfeiçoa a linguagem que começou a elaborar nos trabalhos anteriores, Ramilonga e Tambong. Se em Ramilonga chamava a atenção a unidade em torno de temas e timbres e se a marca de Tambong era a diversidade sonora e poética, Longes pode ser definido como uma síntese dessas qualidades, por mais paradoxal que isso pareça, e um avanço a partir delas.

 

 

Os arranjos de Longes têm sua base no violão de aço arpejado de Vitor Ramil e nos baixos melódicos de Pedro Aznar. Participam também Santiago Vazquez e Marcos Suzano nas percussões, o baterista Christian Judurcha, o pianista clássico Gabriel Victora, o guitarrista Bernardo Bosísio, a cantora Adriana Maciel, um quarteto de sopros e uma orquestra de cordas.

 

 

A apresentação gráfica de Longes traz fotografias feitas por Vitor e sua mulher Ana Ruth em vários países, além de fragmentos de Satolep, romance que Vitor escreveu simultaneamente à criação das canções do disco.

 

 

Em 2010, na cidade de Buenos Aires, vitor Ramil gravou "Délibáb". "Delibáb" está composto por doze músicas, seis em português e seis em espanhol. As músicas em português estão baseadas em poemas de João Da Cunha Vargas (1900-1980), enquanto as músicas em espanhol são milongas de Jorge Luis Borges (1899-1986). Este disco inclui um DVD no qual pode se ver o processo completo de gravação, com a participação especial de Caetano Veloso (em "Milonga de los morenos") e Carlos Moscardini (violão). Sobre o nome deste trabalho, cujo significado é “miragem” ou, mais precisamente, "ilusão do sul", vem do húngaro "déli" (do sul) mais "báb" (de bába: ilusão). Segundo o próprio Ramil "O délibáb é um fenômeno extraordinário da planície húngara, tão semelhante às planícies do sul do nosso continente. Único em seu gênero, este tipo de espelhismo transporta paisagens muito distantes a horizontes quase desérticos, reproduzindo ante os olhos maravilhados do observador, em dias de calor, o desenvolvimento de cenas distantes." Ao escutar o disco pode-se experimentar certamente um "délibáb", porque a música projeta imagens remotas, de arrabaldes buenairenses e ambientes campeiros, na urbanidade de nossos tempos atuais. Como não ficar maravilhado diante desta “ilusão do sul”, ainda que seja só um "délibáb"?





Discografia


1981 Estrela, Estrela
1984 A Paixão de V Segundo Ele Próprio
1987 Tango
1995 À Beça
1997 Ramilonga - A Estética do Frio
2000 Tambong
2004 Longes
2007 Satolep Sambatown
2010 Délibáb
2013 Foi no Mês que Vem



Obra literária

Pequod (1999) - (disponível em formato eletrônico)
A Estética do Frio (2004)
Satolep (2008)
A primavera da pontuação (2014)



Referências


Arthur Dapieve - Brock: - 1995 176 "Mas duas participações especiais ajudavam a localizar o trabalho de Thedy, Stein e Homrich no leque da música gaúcha: Vítor Ramil, irmão de Kleiton &c Kledir, recitava versos pelo telefone na faixa "

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Minha alma agora se espalha na musicalidade do Neotropicalismo, um movimento que toma músicos do RS, Uruguay y Argentina.

Pautados no Tropicalismo dos brasileiros mas mais abertos ao seu tempo por ser esse tempo uma outra coisa. Vivemos novos tempos. Mas a poética é sempre uma doce coisa em sua perenidade.

O poema é perene, como perene é o amor sincero.

E isso me bastaria.

 
Ouço  

2013 Foi no Mês que Vem



Paulo Cesar Fernandes

22 07 2014

domingo, 20 de julho de 2014

20140720 O som da Vida

O som da Vida




A vida é feita pá cantarla
Cantar em versos
Cantar em cantos
Recantos e recortes de memórias


Momentos de alegria e solidão
Entre o escrevente e seu pensar
Seu sentir, imaginar


É a mágica do viver
Transposto em algo
Transcendente e metafísico
Como el cantar.




Paulo Cesar Fernandes

20  07  2014

P.S.: Vermelho de sangue, vermelho de vida, vermelho de amor. É vermelho meu cantar.

quinta-feira, 17 de julho de 2014

20140717 Faixa de Gaza

Faixa de Gaza.


"Enquanto eles se batem
De um rolê que vc vai ver
Eu sou, eu sou
Eu sou amor da cabeça aos pés"




Novos Baianos contra a Guerra do Vietnam.


E os trogloditas da Terra continuam a vender armas.
A armar guerras.
A encher o bolso de dinhero cheio de sangue.
Com cor de sangue.
Com cheiro de sangue.



Eu vejo sangue por toda parte.
A tela da minha TV ganhou autonomia.

E apenas me mostra sangue.

Sangue na Baixada Santista
Sangue na minha Santos que tanto amo
Sangue na Paulista
Sangue no Bom Retiro
Sangue nos Gabinetes
Sangue correndo nos Estádios
Sangue correndo no chão das fábricas
As minhas mãos estão vermelhas e eu tenho medo.
É preciso parar com isso.



Paulo Cesar Fernandes

17  07  2014

20140717 D. Pedro Casaldaliga e sua lucidez

D. Pedro Casaldaliga

Entrevista a Cadernos do Terceiro Mundo

8 de julho de 2012
 
Cadernos do Terceiro Mundo N° 224
Ano 2000 - Setembro/Outubro





A última palavra é dos pobres


Aos 72 anos, o bispo matogrossense, espanhol de nascimento, explica sua trajetória pastoral com uma simples frase: "Pecado é não fazer política"

Cícero Henrique



O bispo de São Félix do Araguaia, D. Pedro Casaldáliga Piá, conhecido internacionalmente pelas posições ideológicas bem definidas, diz que o Brasil precisa de uma Operação Mãos Limpas para garantir o retorno da credibilidade à classe política.


"Se há corruptos roubando dinheiro público, é porque há corruptores do outro lado e uma sensação de impunidade nas duas pontas", resume o bispo, nesta entrevista que concedeu a cadernos do terceiro mundo na sede da regional oeste da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em Cuiabá.


Filho de um lavrador-vaqueiro, Casaldáliga, espanhol de nascimento, chegou ao Brasil como missionário, em 1968. No mesmo ano, optou pelo trabalho em Mato Grosso. Eram tempos difíceis, em pleno regime militar. Com inúmeros livros editados, inclusive em catalão e castelhano, o bispo mantém sua postura progressista. Aos 72 anos, explica seu posicionamento com uma simples frase: "Pecado é não fazer política".



Religioso da Congregação dos Missionários Claretianos, D. Casaldáliga atua junto a pastorais, já dirigiu revistas, rádios, escreveu para jornais e até fez teatro. Com esse perfil sente-se autorizado a admoestar autoridades pilhadas em situações delicadas, do ponto de vista moral ou político.



Nesta entrevista, além de apontar a incompetência do Judiciário para punir a corrupção, pede a instalação de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar as acusações que pesam contra o presidente Fernando Henrique Cardoso, fala da dívida externa, da ala progressista da Igreja e do trabalho com a prelazia, na região que costuma chamar de "nortinho".





Qual a análise que o senhor faz do governo Fernando Henrique Cardoso, atualmente?

D. Pedro Casaldáliga Piá - Sobretudo nas célebres comemorações oficiais dos 500 anos do Brasil, Fernando Henrique Cardoso mostrou por que vinha acumulando uma imagem negativa: porque no seu governo falta o diálogo, negando-se a conversar com a oposição, esquivando-se de críticas e até se negando a reconhecer o direito dos povos, fato mais do que legítimo num processo democrático. A imagem do que foi a repressão dos povos indígenas na Bahia certamente deixa qualquer cidadão humilhado. Foi como me senti. O governo parece cínico. Além disso, reconhecemos que estamos submetidos a uma dívida bastante poderosa que, a cada dia, denigre ainda mais nossa imagem lá fora. Não adianta mentir, mentir e mentir. Chega a ser mesmo ridícula a encenação do escândalo que envolve o ex-secretário da Presidência. Por que não se aceita uma Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar os fatos? Se isso ocorresse, a população ficaria mais tranqüila.


Desde sua chegada ao Brasil, há 32 anos, o senhor considera que o país está mais corrupto?

Casaldáliga - Acho que, atualmente, se conhece mais a corrupção. A mídia não tem dúvida de que há muitas possibilidades de corrupção e isso é esboçado diariamente, o que não ocorria em épocas anteriores. A famigerada distribuição de renda tem facilitado os atos de corrupção. E, se há corruptos roubando dinheiro público, é porque há corruptores do outro lado e uma sensação de impunidade nas duas pontas.


O senhor acompanhou o assunto do escândalo Eduardo Jorge?

Casaldáliga - Acompanhei pela mídia e lamento profundamente que não se faça uma CPI limpa, redonda, para apurar as denúncias. Ficaríamos todos mais tranqüilos e o prestígio do presidente só teria a ganhar, principalmente se ele não tiver culpa no processo. O povo assistiu estupefato à resposta do presidente, que disse assinar um documento sem saber o que estava assinando. Isso eu até aceitaria, porém, de um pobre sertanejo que dificilmente sabe ler. Agora, de um sociólogo... Essa desculpa do Fernando Henrique, além do mais, é muito pouco inteligente.


O que pensa do neoliberalismo?

Casaldáliga - A política neoliberal é o capitalismo assassino. É onde o capitalismo é levado às últimas conseqüências, porque, mais mundializados do que estamos, impossível. A situação atual conflita com o que tinha antes. Ou seja, quando ainda havia regimes socialistas e comunistas, existia no mundo um certo equilíbrio de forças. Hoje, o capitalismo neoliberal tem as mãos livres, não existe complicador. Daí a bandalheira em que se encontra o Brasil em pleno ano 2000.


Como o senhor define a globalização?

Casaldáliga - É o capitalismo neoliberal mundializado. Aliás, é inclusive uma palavra gringa, que já indica de onde é que vem o império persistente de hoje em dia. Eu sou a favor da mundialização, acho que até Deus é a favor da mundialização, porque a humanidade é uma só. Mas queremos outro tipo de mundialização. Um modelo que seja discutido, como, por exemplo, a mundialização da solidariedade, da partilha, de iguais oportunidades para os diferentes povos e para as diferentes pessoas e culturas. Longe de ideologias político-partidárias.



A Igreja Católica, hoje, apresenta um avanço do chamado setor carismático. Está aí, por exemplo, o padre Marcelo e outros que, de certa forma, acabam classificados de produtos. Como o senhor vê isso?

Casaldáliga - Você sabe que há carismáticos católicos e carismáticos evangélicos. Isso é fruto, em parte, da religiosidade, da gente que está vivendo em um mundo terrível. Se apela mais facilmente para um tipo de religiosidade consoladora, estimulante, de curas, de milagres e consolação interior. Por outro lado, não tenho dúvida de que o povo do mundo inteiro passa mal e apela a essas religiões um pouco mais imediatistas. Se o povo da classe média pratica essa religião, isso não significa dizer que não estariam com uma visão da religião cristã menos voltada por uma luta de justiça e libertação. A classe média, logicamente, fará sempre uma opção por uma Igreja mais carismática do que por uma igreja de libertação.



Esse crescimento do setor carismático, em tese, freia um movimento evangélico como o do bispo Edir Macedo?

Casaldáliga - Se for carismático bem cristão, a pregação é a mesma, ou seja, Pai, Filho e Espírito Santo. O problema é que o imediatismo acaba complicando a decisão das pessoas. Eu costumo dizer uma expressão gráfica, ou seja, que o Espírito Santo é representado por uma pomba com as duas asas. A asa direita seria contemplação, a gratuidade e a intimidade. A asa esquerda seria a profecia, a militância e o compromisso. O movimento carismático facilmente pode pecar por cortar a asa esquerda do Espírito Santo. Dirão que nós, os da Teologia da Libertação, cortamos a asa direita. Vamos fazer questão de respeitar as duas asas, contemplação e luta. 4 E os progressistas, a ala que pratica a Teologia da Libertação, acabam sendo prejudicados com o crescimento dos carismáticos?Casaldáliga - A Teologia da Libertação, as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), essas igrejas que vocês chamam de progressistas não têm hoje, logicamente, o gancho publicitário que tinha anos atrás, quando era novidade. Isto, por um lado. De outro lado, já está muito mais diluída na própria vida normal da Igreja, há muitos textos e registros no Brasil e em outros países sobre isso. Muitos textos de encíclicas papais, que são também utilizados na Teologia da Libertação, esboçam este raciocínio. Se você quiser, há até expressões do próprio papa que podem parecer marxistas, como "os ricos cada vez mais ricos à custa dos pobres cada vez mais pobres". Isso é dialético: o conflito entre trabalho e capital.<p>Eu acho que a Teologia da Liber-tação já deu uma grande contribuição à Igreja e abriu um caminho irreversível de compromisso da fé com a vida concreta, da Bíblia com a política, da terra com o céu, que era retomar o ministério da reencarnação. Nós, cristãos, acreditamos em um Deus de carne, que se fez pobreza, se fez morte e se fez ressurreição.



Com relação ao papa, como o senhor vê as indicações de bispos mais conservadores pelo Vaticano?

Casaldáliga - O problema é que não é só o papa quem indica. Agora, menos ainda, com a idade em que se encontra. São os bispos e os cardeais que sugerem. Eu admito que, oficialmente, nos últimos anos da Igreja, há um certo processo de involução. Em parte, se faz questão de nomear bispos mais de centro. Agora, sempre há alguma nomeação de bispos, desses que vocês chamam de progressistas e que contam com o respaldo das Comunidades Eclesiais de Base. Atuam, de preferência, em pastoral social. Veja bem, há de tudo um pouco.



Em termos políticos, de conscientização, qual foi a grande conquista no Brasil, até hoje?

Casaldáliga - Sem dúvida, a consciência do povo. Apesar de todos os pesares, há muito mais consciência hoje do que há 30 anos, quando eu cheguei aqui.<p>Fruto disso, os movimentos populares e todo movimento da cidadania, essas marchas que estamos presenciando nos últimos anos, esse próprio plebiscito de agora contra a dívida externa, esse milhão de assinaturas contra corrupção eleitoral, o movimento dos sem-terra, as próprias pastorais sociais na Igreja. Há mais consciência, mais mobilização e mais organização.



O que o senhor diria sobre a participação popular nas eleições?

Casaldáliga - Votar limpo, não vender o voto. Segundo lugar, participar, participar e participar, tanto na luta popular, cidadania, grupos de rua, de bairros e dentro de casa, participe. Em terceiro, saber que a maioria e os pobres têm a última palavra. A última palavra não é somente dos pobres pelo fato de serem maioria. É que, por último, essa é a opção de Deus: eu acredito no Deus da vida, que é o Deus dos pobres.



Como anda a sua luta no Araguaia, principalmente com relação à Prelazia?

Casaldáliga - Nós continuamos na luta de sempre, lá naquele nortinho, que, com freqüência, as autoridades e os meios de comunicação de Cuiabá esquecem. Só se lembram do nortão, que é mais produtivo, e esquecem do nortinho.



E a dívida externa?

Casaldáliga - O encerramento da dívida externa é problema difícil, mas não impossível de resolver. Para incentivar a sociedade, parodio o líder popular venezuelano Simón Bolívar, dizendo que as pessoas devem primeiramente fazer as coisas impossíveis, deixando para amanhã o que é difícil. A dívida externa figura como a maior dependência dos países do Terceiro Mundo em relação aos países desenvolvidos.<p>A dívida causa uma dependência visceral, constituindo um obstáculo de norte a sul. A manutenção do pagamento da dívida significa a maior guerra que já aconteceu na história da humanidade. Nenhuma guerra tem matado mais do que esta. Ela não é o holocausto de um povo só, mas de continentes inteiros. Dar continuidade ao processo de quitação da dívida implica deixar de pagar as dívidas sociais.



Qual seria a solução?

Casaldáliga - A forma de eliminar esse mal pela raiz seria a união política dos países subdesenvolvidos em torno desse propósito. Se México, Chile, Argentina e Brasil se unissem, os fornecedores externos baixariam a cabeça.<p>Os credores não cedem, porque nós, os países pobres, esquecemos a força que nós teríamos, se algum dia nos uníssemos.

domingo, 6 de julho de 2014

20140625 Rua Antonio Bento


Rua Antonio Bento

 
Dona Ana Clara acabara de sair da igreja de sua predileção, na Avenida Ana Costa. Nunca lembrava seu nome, mas nunca esquecia, desde a mais tenra idade era levada pelas mãos dos pais à missa. Sempre aos domingos e sempre na missa de 17 horas.

 
Diziam os pais: “na missa das 18 horas tem muita gente, e preferimos lá estar com número menor e mais tranquilidade”.

 
Estivera na igreja para agradecer sua recuperação do acidente. A moto a tinha deixado por um tempo fora de circulação na sua cozinha, na sua varanda. Mas o menino não tinha culpa nenhuma. Ela que, pensando nas compras a fazer no mercadinho do bairro, não atentara a nada. Simplesmente atravessara, sem olhar, pela traseira de um caminhão.

 
Após o tempo de tratamento aquela era sua primeira manhã sem bengala. O médico já a incentivava de semanas, mas: “Cadê coragem?” – perguntava ao genro e à filha.

 
Caminhava lento naquela manhã, não apenas pela queda, mas para olhar as coisas, as ruas, a cidade. Foi nesse passo lento que entrou na Rua Antonio Bento, rua de sua infância e juventude até o casamento.

 
Cada trecho da rua lhe fazia brotar uma lembrança. Nunca mais havia passado por ali a pé. Sempre a filha com o carro a levava a todos os lugares. A bondade da filha lhe tolhera esse prazer de ver a cidade. Agora caminhava, lento e sem bengala ia caminhando. Sob o sol da manhã de inverno.

 
Numa casa, que pensava ser a que havia habitado estancou. Pela porta aberta da garagem reconheceu seu interior. Era sua própria casa. Um pranto desatado brotou forte do seu peito. A tal ponto chorou que os dois rapazes trabalhando na retirada dos detalhes da fachada desceram dos andaimes para acudi-la. Trouxeram-lhe uma cadeira, um copo de água.

Lentamente o pranto se lhe foi acalmando.

_ Desculpem meninos. Perdão, mil perdões.

_ Está se sentindo mal senhora? Que aconteceu com a Senhora Dona...

_ Ana. Eu sou Ana Júlia. Morei nessa casa por quase trinta anos. Sabe o que são trinta anos numa mesma casa? Eram vizinhos e amigos ao mesmo tempo. Infância. Juventude. Lembranças fortes...

 
Os dois rapazes se entreolharam meio sem compreender. Nunca haviam pensado nisso. De seu trabalho ser motivo de tristeza para alguém. Seu costume é encontrar a alegria de quem faz melhorias em sua residência ou edifício.

 
_ É muito chato ver a senhora assim. Não pensamos em fazer mal...

_ Nada disso meu filho. Eu é que sou uma velha boba. Eu sei. O mundo precisa mudar mesmo. Eu sei, eu sei. Mas foi só naquele momento inicial. Agora já acostumei com a ideia.

 
Refeita e se sentindo verdadeiramente bem Dona Ana Júlia sorriu para os rapazes.

_ A senhora não quer que chame alguém?

_ Não filho. A Carvalho de Mendonça é logo ali. Obrigada. Já tomei demais o vosso tempo. Podem voltar para a vossa vida. Eu preciso apenas de um tempinho mais nesta sombra.

_ Pois fique como quiser. Fique tranquila.

 
Voltaram os rapazes à tarefa de descascar os detalhes da fachada da casa. Ao som das pancadas pedaços se desprendiam e vinham ao chão. Eram pedaços da infância e juventude de Dona Ana Júlia que já não mais cabiam nos tempos presentes e tinham a obrigação de ceder espaço ao novo.

Dona Ana Júlia riu dos seus sentimentos.

_ Bobagens de velha! – pensou com seus botões.

Levantou e acenou para os rapazes antes de partir:

_ Ei! Que Jesus abençoe vocês. Obrigada!

_ Assim seja, Dona, assim seja!

 

Paulo Cesar Fernandes

25/06/2014

sexta-feira, 4 de julho de 2014

20140704 Epistemología del Sur y Filosofía de la liberación

20140704 Epistemología del Sur y Filosofía de la liberación

Apresentado por Enrique Dussel na UACM (Universidad Autonoma de Ciudad de Mexico)

o Professor Boaventura de Sousa Santos da Universidade de Coimbra nos fala do tema acima.

São quase duas horas nos apresentando o mundo atual numa perspectiva desde o SUL tanto do ponto

de vista geográfico como ecoômico e geopolítico.

Uma palestra de quase duas horas, mas que vale a pena prestar atenção.



https://www.youtube.com/watch?v=ssxd_j72jXs


Minha contribuição aos que acompanham este Blog.

A grande contribuição é do Professor Boaventura.

Grato.

Paulo Cesar Fernandes

04 07 2014

quinta-feira, 3 de julho de 2014

20140703 Proibido proibir

“vocês não estão entendendo nada”
Caetano Veloso



Um ano depois do impacto causado pelas guitarras nas canções “Alegria, alegria” (Caetano) e “Domingo no parque” (Gil), apresentadas no III Festival de Música Popular Brasileira da TV Record, Caetano Veloso e Gilberto Gil voltaram a surpreender o público no III FIC, Festival Internacional da Canção, promovido pela Rede Globo.


Caetano, acompanhado pelos Mutantes, defendeu “É proibido proibir” e Gilberto Gil, com os Beat Boys, “Questão de Ordem”.


A apresentação de “É proibido proibir” acabou se transformando num happening acaloradíssimo naquela noite de domingo, 15 de setembro de 1968.


Na final paulista do FIC, realizada no Teatro da Universidade Católica de São Paulo, a música de Caetano foi recebida com furiosa vaia pelo público que lotava o auditório.


Caetano Veloso
É Proibido Proibir


A mãe da virgem diz que não
E o anúncio da televisão
Estava escrito no portão
E o maestro ergueu o dedo
E além da porta
Há o porteiro, sim...


E eu digo não
E eu digo não ao não
Eu digo:
É! -- proibido proibir
É proibido proibir
É proibido proibir
É proibido proibir...


Me dê um beijo, meu amor
Eles estão nos esperando
Os automóveis ardem em chamas
Derrubar as prateleiras
As estantes, as estátuas
As vidraças, louças, livros, sim...


E eu digo sim
E eu digo não ao não
E eu digo:
É! -- proibido proibir
É proibido proibir
É proibido proibir
É proibido proibir
É proibido proibir...


(falado)
Caí no areal na hora adversa que Deus concede aos seus
para o intervalo em que esteja a alma imersa em sonhos
que são Deus.
Que importa o areal, a morte, a desventura,
se com Deus me guardei
É o que me sonhei, que eterno dura
É esse que regressarei.

Me dê um beijo meu amor
Eles estão nos esperando
Os automóveis ardem em chamas
Derrubar as prateleiras
As estátuas, as estantes
As vidraças, louças, livros, sim...



E eu digo sim
E eu digo não ao não
E eu digo: É!
Proibido proibir
É proibido proibir
É proibido proibir
É proibido proibir
É proibido proibir...



Os Mutantes mal começaram a tocar a introdução da música e a platéia já atirava ovos, tomates e pedaços de madeira contra o palco.


O provocativo Caetano apareceu vestido com roupas de plástico brilhante e colares exóticos. Entrou em cena rebolando, fazendo uma dança erótica que simulava os movimentos de uma relação sexual. Escandalizada, a platéia deu as costas para o palco. A resposta dos Mutantes foi imediata: sem parar de tocar, viraram as costas para o público.


Gil foi atingido na perna por um pedaço de madeira, mas não se rendeu. Em tom de deboche, mordeu um dos tomates jogados ao chão e devolveu o resto à irada platéia.


Caetano fez um longo e inflamado discurso que quase não se podia ouvir, tamanho era o barulho dentro do teatro.


Mas é isso que é a juventude que diz que quer tomar o poder?


Vocês têm coragem de aplaudir, este ano, uma música, um tipo de música que vocês não teriam coragem de aplaudir no ano passado!


São a mesma juventude que vão sempre, sempre, matar amanhã o velhote inimigo que morreu ontem!


Vocês não estão entendendo nada, nada, nada, absolutamente nada.


Hoje não tem Fernando Pessoa.


Eu hoje vim dizer aqui, que quem teve coragem de assumir a estrutura de festival, não com o medo que o senhor Chico de Assis pediu, mas com a coragem, quem teve essa coragem de assumir essa estrutura e fazê‑la explodir foi Gilberto Gil e fui eu. Não foi ninguém, foi Gilberto Gil e fui eu!


Vocês estão por fora! Vocês não dão pra entender.


Mas que juventude é essa?

Que juventude é essa?

Vocês jamais conterão ninguém.

Vocês são iguais sabem a quem?

São iguais sabem a quem?

Tem som no microfone?

Vocês são iguais sabem a quem?

Àqueles que foram na Roda Viva e espancaram os atores!


Vocês não diferem em nada deles, vocês não diferem em nada.

E por falar nisso, viva Cacilda Becker! Viva Cacilda Becker!

Eu tinha me comprometido a dar esse viva aqui, não tem nada a ver com vocês.


O problema é o seguinte: vocês estão querendo policiar a música brasileira.


O Maranhão apresentou, este ano, uma música com arranjo de charleston. Sabem o que foi? Foi a Gabriela do ano passado, que ele não teve coragem de, no ano passado, apresentar por ser americana.


Mas eu e Gil já abrimos o caminho.


O que é que vocês querem? Eu vim aqui para acabar com isso!


Eu quero dizer ao júri: me desclassifique.

Eu não tenho nada a ver com isso. Nada a ver com isso.

Gilberto Gil. Gilberto Gil está comigo, para nós acabarmos com o festival e com toda a imbecilidade que reina no Brasil.


Acabar com tudo isso de uma vez. Nós só entramos no festival pra isso. Não é Gil? Não fingimos.


Não fingimos aqui que desconhecemos o que seja festival, não.


Ninguém nunca me ouviu falar assim. Entendeu?


Eu só queria dizer isso, baby. Sabe como é? Nós, eu e ele, tivemos coragem de entrar em todas as estruturas e sair de todas. E vocês?


Se vocês forem… se vocês, em política, forem como são em estética, estamos feitos!


Me desclassifiquem junto com o Gil! junto com ele, tá entendendo?


E quanto a vocês… O júri é muito simpático, mas é incompetente.


Deus está solto! Fora do tom, sem melodia.


Como é júri? Não acertaram?


Qualificaram a melodia de Gilberto Gil?

Ficaram por fora.

Gil fundiu a cuca de vocês, hein?


É assim que eu quero ver.

Chega!

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O lema das paredes do "Paris 68" foi trazido para o Brasil no rítulo dessa música.


Paris fervia nas agitações de rua e na tomada da Sorbonne pelos estudantes.


General De Gaulle desmoralizado.


Nessa época o maior jornalista do Brasil, Mino Carta comandava a Veja. Era uma Veja que via e denunciava.


"Chegaremos a isto?" mostrou a capa da Veja nº 1 ou 2 onde o General de plantão aparecia no Congresso Nacional sentado só.
Edição recolhida horas após sua distribuição nas bancas. A capa se referia ao fechamento do Congresso Nacional.


Até o AI-5 todos os Meios de Comunicação de Massas do Brasil apoiavam o Golpe Militar. Pois sempre estiveram e estão a serviço do Governo dos Estados Unidos.


Quando a Ditadura começou a censurar mais fortemente o Jornal Estado de São Paulo este se rebelou. A Folha nada. Sempre foi o que é hoje: um jornaleco.


Não se pode ler a História do Brasil fora do contexto mundial e especialmente Latinoamericano. Todos os paises do Cone Sul estavam sob Botas Ditatoriais, obedecendo aos seus verdadeiros mandatários à época os EEUU. Hoje quatro paises se libertaram de tal jugo, o que lhes custa caro.


Mas toda liberdade tem um preço.


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Caetano hoje.

Caetano responde às manipulações da Rede Globo.


https://www.youtube.com/watch?v=TyrSIRRGWUE


Sempre batendo de frente.

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Paulo Cesar Fernandes

03 07 2014