sábado, 30 de junho de 2012

Eu e ela, a musica

Eu e elamusica
Me vejo de novo no Gonzaga, rodando devagar pelas ruas da memória, sem a impaciência dos demais, que vem e vão a algum lugar.
No meu caso não vou a lugar nenhum. Passeio internamente, e garimpo emoções ouvindo Crosby Still Nash and Young, trilha sonora de todo um tempo de mudanças de percepções. Fora e dentro de mim.
Ouço a memória me chamar prá mais longe e paro na Rua Manoel Vitorino 62. A casa continua lá. Seus 3 andares, sua fachada ligeiramente modificada, mas lá está. Um casario de lembranças. O relógio da sala onde aprendi a ver as horas. A mais remota lembrança da minha relação afetiva com a música: as canções de Luis Gonzaga nos dias de encerar a casa, canções que se misturavam ao cheiro de cera e ao cheiro da comida em preparo na cozinha.
A música do reclame do café de então. Toda vez que tocava, me via correndo para junto do radio da sala, um magnetismo não explicável nos meus tenros 2 ou 3 anos. Menos que cinco é certo, pois aos 5 cheguei à Pasteur. Capítulo à parte na construção de uma vida onde muitas notas musicais se desprenderam dos muros ainda baixos, ou das beiras de calçada onde sentávamos sem outra preocupação que cantar juntos, Zé, Cabeto, eu e mais...
Na última quadra, sentado no meio-fio os primeiros versos:
                O Che é homem de fibra.
                O Che é homem de bem
                O Che ...
                O Che não teme ninguém.
A formação ideológica autônoma. Sem influência nenhuma. A Turma da Pasteur não era dessas coisas. Eu sou dessas coisas. Sou de esquerda, de sinistra, left, anticapitalista. Sou eu. Moderado nunca.  Tal qual Dario Fo. A Turma da Pasteur não. Cada um tem seu jeitinho. Seu caminho. Seu projeto.
Acho que eu não tenho projeto. Ou talvez este seja meu projeto. Exatamente Isto.  Falar e dizer coisas a quem quiser ouvir. Sempre há ouvido sábio colhendo palavras do vento. Eu, apenas falo, simplesmente.
Falo duro, seco e direto. Mas sempre, sempre falo do coração.
Ouvidos há que me odeiam as palavras. Por sorte e por certo são ouvidos distantes, afetivamente distantes.
As letras começaram a cair tal qual as folhas das árvores, nos retornos a casa pela Rua Paraguai, pela Tolentino Filgueiras,...
Um texto aqui, um poema ali, um chão de tênis aos meus pés.
Assim cresceram os cabelos. Ao mesmo tempo. Todos os cabelos do mundo cresceram juntos. Idéias curtas?  Não, não Kennedy, não mesmo. Cresceram idéias às quais nem sonhava tua geração de riquinhos ianques. Tua soberba. No seio do teu país, como um câncer, uma ferida purulenta, bem dentro do American Way of Life. Humm como foi bom o Rock and Roll de verdade, a contracultura, os Hippies, Hendrix, Joplin, Morrisson ... Por vezes falar ou escrever corta nossa carne, pois somos mortais. E muita gente nossa foi embora sem deixar endereço de contato.
Como na Pasteur, a vida nos levou embora e não nos permitiu o novo endereço.
A Rita da Manoel Vitorino é uma palavra apenas, marcada a fogo naquilo chamado memória.
As ruas andam, seguem, mudam, mas a memória não. Retrato fiel, imorredouro, que o tempo não apagará.
Com este texto chego em casa. Nova casa, nova rua, novo tempo. Mas a memória segue perene, guardando o que tem prá guardar.
Paulo Cesar
28/10/2007

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