quarta-feira, 22 de novembro de 2017

20171120 Pediatra

Pediatra


João Luis passara um sereno dia em seu consultório. Enquanto pediatra lhe causou surpresa uma segunda-feira tão calma. A ponto de sair mais cedo, ao fim da tarde.

Bate uma ducha já tendo em mente o cardápio para o jantar. Havia de fazer uma surpresa para a esposa.

Já na cozinha espreme um limão e joga um chá gelado por cima, num desses copos de cano alto.

Seu foco era o macarrão ao molho branco com frutos do mar. Antes uma salada de folhas para mais alegrar a esposa. Lava as folhas todas e as passa na bacia com vinagre. E parte para o preparo ágil dos frutos do mar.

_ Quero tudo adiantado, bem encaminhado para a chegada de Alexia. - dizia com seus botões.

Tendo tudo pronto, sentou no sofá da sala, copo de chá em mãos, e solta os pensamentos. Vagava nos sonhos quando a porta abre.

Entra a esposa, trazendo o sorriso de sempre, e uma pasta de processo sob o braço.  

Se espanta de ve-lo assim. De chambre, sorridente e com o copo cheio de gelo no sofá.

_ Eu sempre às voltas com as crianças e você com seus processos todos. - diz ele.

_ Eu escolhi a advocacia. E não reclamo por ter trabalho. - diz ela se reclinando sobre o sofá beijando-o.

_ Mas hoje vamos fazer algo diferente, doutora. Uma noite de paz não lhe atrapalhará a vida. Não é?

_ Vamos pedir pizza então? - diz Alexia com sarcasmo.

_ Não hoje, - responde o marido - Preparei algo simples para nosso jantar. Eu bebo chá gelado. Quer beber algo? Eu gostaria da sua companhia agora. Depois, durante o teu banho finalizo a preparação do jantar.

Alexia se alegra.

_ Pois um chá gelado vai bem. E eu te conto o meu dia. Pelo jeito a casa já tem movimento de longo tempo.

_ Verdade. Nada de consultas nesse fim de tarde e aproveitei para vir para casa. 

Passei na padoca, um café, pães e algum toque de condimento.

Relaxadamente conversa o casal, fazendo brinde com chá mate. Falam ao mesmo tempo e João prefere ouvir a esposa.

_ Solenemente devo lhe dizer da minha gravidez. Dentro de sete ou oito meses chegará nossa filha ou filho.

Ele salta da poltrona alegre, feliz mesmo. Beija-a com carinho.

_ E eu pensava em te presentear com um jantar. Acabo recebendo um presente muito mais valioso que tudo. Me presenteias com uma vida. Como é bom pensar nessa negrinha ou nesse negrinho vindo à Vida. Me abraça forte minha querida, muito forte.

Alexia pede um tempo para seu banho, e o marido segue feliz para a cozinha.

No jantar reinava um clima de serenidade e gratidão mútua.

Após tudo ordenado. Antes de ligar a TV Alexia ganha um ar de preocupação. Frente as questões do marido revela:

_ Como será a vida de uma criança negra num condomínio de brancos?

João Luis segura com doçura a mão da esposa:

_ Será tão boa ou melhor que qualquer outra de nosso condomínio. Eu te garanto. Afinal, de crianças e de pais eu tenho doutorado nestes dez anos de vida pediátrica.

Fez uma pausa. O olhar entristeceu.

_ Já enfrentei muitas ofensas, mas recebi muitos elogios por outra parte. Sou calejado em assuntos de racismo.

_ Que segurança é essa? - pergunta Alexia assustada.

_ Entenda. Tudo de material presente ao nosso redor é fruto de uma luta constante. E eu não me iludo, uma luta ainda não terminada. Mas eu não vou deixar, por nada neste mundo, algo ou alguém tirar a possibilidade de nossa criança ser feliz. Mais feroz será minha luta se o ponto for o racismo. Pode escrever.

Enquanto Alexia lhe sorria João arrematou:

_ Seremos felizes. Seremos uma família feliz. Nosso amor vai superar tudo e todos.

E assim se passou. Tal qual pensado pelo Doutor João Luis Louveira, um médico pediatra.


Paulo Cesar Fernandes.

20/11/2017.

Nota:

Escrito no Dia de Zumbi dos Palmares.

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