domingo, 31 de agosto de 2014

20140831 Perdas

Perdas


Estava no quilo onde costumo ir aos domingos.


Deitava grão de bico no prato. Lembrei de quanto o Nick gostava de almoçar comigo, sendo este um dos seus petiscos favoritos.


Me bateu uma profunda tristeza em saber vazia a casa. Sem a presença daquele pequeno mijãozinho. Companheiro por quase quinze anos.



E eu vinha curtindo a minha dor, quando do nada um pensamento se fez presente:


_ E se fosse um filho teu? Como tantos filhos assassinados neste Brasil imenso e injusto?


Me recompus de imediato. Os olhos tristes retomaram a cor, e a esperança sempre presente voltou.



_ Eu não tenho o direito de tanta dor por um cão, - pensei eu - se ao mesmo tempo pais e mães das mais diversas classes sociais tem seus filhos arrancados de seu convívio.



Efetivamente não tenho esse direito.


Segundo o jurista Luis Flávio Gomes, meu referencial na área jurídica, são 300 mortes por dia no Brasil: 170 por acidentes de trânsito e 130 por armas de fogo.


Isto é muito mais que perdia a Nicarágua na Revolução Popular Sandinista, com início a 19 de julho de 1979. Alí a direita, a burguesia vendepátria e os mercenários financiados pelos EEUU matavam e destruiam a produção. Como ocorre hoje na Venezuela. Os vendepátria se unem contra o povo.


Mas nunca chegou a tal número de mortes/dia na Nicarágua.


Voltando à nossa dor. É claro que o Nick ainda está presente em minha vida. Criei hábitos de convivência.



Por exemplo, nos assaltos à geladeira depois da meia noite eu não acendia a luz da cozinha, pois ele reivindicava seu quinhão latindo bastante. Isso não é bom para vizinho nenhum. Assim, assaltava a geladeira de luzes apagadas.


Muitas vezes, ainda  hoje pego as coisas sem acender a luz da cozinha.



Toda perda doi muito.



Mas o que mais faz doer meu coração é a perda de humanidade de algumas pessoas.


Quando o racismo se apresenta ao Paulão; Arouca; Aranha; e tantos outros. O coração racista e preconceituoso perdeu sua humanidade. Perdeu sua sensibilidade.


Perdeu, perdeu demais.


Mas o ódio não nos cabe. Mais vale a serenidade. Acolher o desequilíbrio do outro com carinho até.


Assim como o grão de bico ajuda a alimentar o meu corpo; o amor deve ajudar a me alimentar; eu, ser viajante de tantas eras e de tantas aventuras e venturas vivenciadas.


Não cabe o ódio nas trilhas deixadas por Francisco de Assis.



Paulo Cesar Fernandes.

31/08/2014

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