Negro, magricela e refugiado.
“Hoje
é difícil pensar que uma benevolência divina zele sobre o mundo onde há tanta
miséria, guerra e sofrimentos. O decisivamente importante é que com Deus ou sem
Ele, cabe a nós mudar o mundo. Nossos males não resultam de descuidos ou
cochilos divinos: são provocados por nós, pelo mau uso da liberdade. Se os
provocamos, somos também capazes de corrigi-los.”
Amartya Sen “Desenvolvimento como
liberdade”
Eu sou de corpo, sou de
alma, de sentimentos, de emoções, tristezas e alegrias.
Tu, desse outro lado do
papel, fiques atento. Tu és de corpo, és de alma, de sentimentos e emoções, com
as tuas tristezas e com as tuas alegrias.
Nisso.
43 milhões de
refugiados habitam a Terra em 2010 segundo dados das Nações Unidas.
Sabes o que é um
refugiado?[1]
Uma gente que tem
corpo, alma, e nada mais, uma vez que vivem num “não local”, num país que não é
o seu, que não lhes diz respeito; para onde, pelos mais diversos motivos foram
obrigados a migrar. Para sobreviver às guerras[2] travadas entre lideres
tribais; guerras por motivos religiosos, ou pela simples intolerância religiosa
dos ocupantes do poder no país de origem.
Cada vez mais eu admiro
os ateus!
Habitam em grandes
acampamentos coletivos, sem a menor privacidade. O prato de comida trazido às
suas mãos é a certeza de sua sobrevivência até o dia seguinte. Este prato lhes
chega às mãos pela ação do ACNUR (Alto
Comissariado das Nações Unidas para Refugiados), e de outras
entidades voltadas para a mesma causa.
43 milhões. Já
pensastes?
43 milhões de espíritos
com poucas/parcas possibilidades de auto-realização, enquanto espírito mesmo.
Vivem para sobreviver apenas. Que progresso seria possível em tais
circunstâncias? Haveria limitantes à evolução?
Richard Hardy e Toni
Negri têm um livro chamado “Império” cuja tese central é que se foram por terra
os dois grandes blocos do mundo: Comunistas x Capitalistas, foi ao chão a
Guerra Fria. O que se formou hoje, foi um grande conglomerado que domina a vida
de todos nós. Esse Império não tem sede central, é de alguma forma não
identificável, se espraia ao longo de todo o planeta. Embora esteja claro quem
são os seus beneficiários; e também aqueles outros, os que garantem a vida boa
desses poucos.
Esses milhões de
pessoas vivendo em tais condições de vida são a vergonha maior de qualquer
sociedade minimamente digna.
E tu leitor? Não ficas
pasmo, nem indignado?
Muitos intelectuais de
valor se somam às entidades internacionais como a ACNUR, divulgando a barbárie
advinda destes tempos de Pós-Modernidade. Pensadores de idéias divergentes e
até antagônicas em tantos outros aspectos convergem no processo de
solidariedade militante se valendo de suas palestras, e de todos os locais onde
caiba a denúncia a tais disparates. Até porque o silêncio é sempre covarde e
conivente.
Condições sociais
indignas, advindas dessa globalização torpe e assassina, acabam por estancar o
processo de desenvolvimento espiritual de toda essa massa humana.
Parece evidente que,
mesmo sob tanta indignidade, possa emergir alguma voz lúcida e capaz de
denunciar, dizendo alto e bom som de todas as humilhações, dores e condições
ultrajantes que esse contingente populacional é submetido.
Talvez uma voz, do
outro lado do papel possa intervir:
_”E nós no Brasil, que
temos a ver com o Congo, Senegal, essa gente lá de longe? Já não bastam nossos
problemas? Ainda mais essa gente. Não sabemos nada deles. Prá que isso?”
Uma coisa é certa: a
nossa ignorância não nasce de nenhuma atitude de algum desses 43 milhões de
seres humanos. Desses irmãos, no sentido mais fraterno que essa palavra possa
carregar/referir.
Enquanto jornalista,
formado e consciente das responsabilidades que tal diploma acarreta, fica
impossível calar ao fato de que notícia para os donos dos MCM (Meios de
Comunicação de Massa) não é o que tenha maior relevância, humanisticamente
falando. Daí a importância e destaque dado à última jóia que a modelo da moda
comprou. Uma modelo que sequer sabe onde se situa o Congo Belga, ou República
Democrática do Congo, um país que perde periodicamente mais gente morrendo de
fome, que os cliques semanais dos seus paparazzis, ou que as mensagens dos seus
seguidores no Tweeter.
Mortos de fome.
Espíritos que em toda a sua existência terrestre jamais tiveram o aconchego
sequer de uma cama com os lençóis recém-lavados.
Uma dúvida bate forte
em mim:
_ Somos ou não somos
culpados de nossa ignorância/desinformação quando o universo que nos cerca é um
turbilhão de informações sem fim?
Nestes Tempos Líquidos[3], quando tudo é fugaz e
talvez sem importância eu paro o tempo, e reafirmo que para mim, a partir de
agora importa, e importa muito, que não mais calemos às misérias humanas.
Buscando sempre saber mais e mais de todas as misérias que assolam o mundo.
Etapa primeira: conhecer
as misérias todas, absolutamente todas.
Etapa segunda:
denunciar sem medo, tanto as misérias materiais, como as misérias morais.
O mundo precisa. O
mundo espera pelas verdades todas, e isto causará a dor; mas uma dor bem menos intensa
que as 43 milhões de dores vividas nalgum lugar do mundo em cada amanhecer.
Pela verdade e pela
vida!!!
Sempre.
Paulo
Cesar Fernandes
25/06/2011
[1]
Segundo a Convenção
das Nações Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados, mais conhecida como Convenção de Genebra de 1951, refugiado
é toda a pessoa que, em razão de fundados temores de perseguição devido à
sua raça, religião, nacionalidade, associação a determinado grupo social ou
opinião política, encontra-se fora de seu país de origem e que, por causa dos ditos
temores, não pode ou não quer regressar ao mesmo.(Fonte: Wikipedia)
[2]
Guerras fomentadas pelos países centrais
da Europa e EUA com o único objetivo de lucrar na venda de armas.
[3]
Título de um livro do polonês Zygmunt
Bauman. Intelectual algumas vezes referido pelos convidados do Café Filosófico,
exibido pela TV Cultura aos domingos 22h.
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