Por que razão uma música nos vem, lá da era das calendas, num domingo sem sol, na hora do café da tarde?
Sou sem resposta.
Lembro da primeira música que me chamou atenção.
Morava eu na segunda casa de minha vida, que eu me lembre.
Desta que moro hoje na Rua Araguaia, minha primeira casa, nada tenho de lembranças.
Esta que chamo de segunda era na Rua Manuel Vitorino, no Gonzaga. Todo mes por ela passava e lá estava. Mes passado passei lá e já se foi ao chão, dando lugar à especulação imobiliária.
Mas, nessa casa, além de aprender a ver as horas, tive minha primeira paixão musical. Isto aos 3 anos mais ou menos.
Descia as escadas para ficar ao pé do rádio, e ouvir uma propaganda de café. Imagino que fosse o Café Caboclo, pois o imagino o mais antigo deles todos.
Lembro duma manhã, de pijamas, desco as escadas em desembalada carreira para grudar ouvidos ao rádio.
Depois de minha familia a Música é a maior alegria de minha vida.
Compete com a Filosofia. Ficam as duas a brigar entre si. E fico eu, entre essas duas amantes muito queridas, cada uma delas uma flor a me trazer perfumes. Oscilo entre ambas com facilidade. E assim sempre será.
Mas hoje, neste domingo, eclode esta música no pensamente, ao sabor de um "café bebido". Né Mara! Mara é a única mulher neste mundão doido a me chamar de Paulo Cesar. E eu gosto disso. Afinal é meu nome e nada feio. Um cafézinho bebido apenas.
Esotérico é o título da música, e vamos a ela:
Esotérico
Gilberto Gil
Não adianta nem me abandonar
Porque mistério sempre há de pintar por aí
Pessoas até muito mais vão lhe amar
Até muito mais difíceis que eu prá você
Que eu, que dois, que dez, que dez milhões, todos iguais
Até que nem tanto esotérico assim
Se eu sou algo incompreensível, meu Deus é mais
Mistério sempre há de pintar por aí
Não adianta nem me abandonar (não adianta não)
Nem ficar tão apaixonada, que nada
Que não sabe nadar
Que morre afogada por mim
Pensando bem é um mistério a relação Homem-Mulher.
Mulheres há que amamos. Desejamos febrilmente. E não conseguimos conviver. A vida a dois é impossível.
Outras, que apesar do desejo menor, de um amor mais sereno, sem grandes arroubos, a presença é um doce estar. Um conviver harmonioso, sem competição, sem qualquer cobrança, ou mesquinharia. Um partilhar de momentos. Harmonia de estar juntos.
Mistério mesmo.
Questões e questões sem respostas, se nos colocamos a meditar sobre o tema.
Gil, um dos filósofos da MPB, traz o tema à baila com graça e beleza.
Mas ele não diz é das relações possíveis, desejáveis, sonhadas. Muitas vezes tomadas de sonhos vãos. Desvãos da existência. Fontes apenas de sofrimento e dor.
Mas nem tudo é assim. O estar a dois é, e pode ser algo sereno. Pode ter o momento de encantamento, de paixão como Almir e Ana do meu conto "Admiração", e depois a coisa ir tomando um rumo mais de companheirismo, mas sempre com o prazer da companhia, num caso como o do conto.
É muito difícil, mas ocorre, de almas complementares se encontrarem, e nesse caso a vida é prazer, em todos os sentidos dessa palavra.
Ficar velhinhos juntos. Isso é de uma poesia muito grande.
E tenho visto, nas caminhadas pela minha cidade de Santos, casais muito bonitos, onde o cuidado com o outro é evidente. Por vezes penso, ser assim o envelhecimento de Ana e Almir. E mesmo quando a vida lhes tire, a mãe de Ana e os pais de Almir, tão bons com o casal, o amor dos dois será um elemento de força no proseguimento da família por eles estabelecida.
Quisera eu, todas as familias da vida real, tivessem a mesma destinação das familias ficcionais. Dos contos capazes de colocar a familia, num patamar de doçura e beleza, que toda familia idealmente deveria conquistar.
O tempo é sempre amigo e acabará trazendo nossos sonhos à realidade.
Quem sabe, as nossas familias todas, possam descobrir pouco a pouco, todos os mistérios da Vida.
E de descoberta em descoberta viver mais plenamente.
Ser sempre, compreensão e amor mútuo.
Paulo Cesar Fernandes
13 01 2013
Nenhum comentário:
Postar um comentário