domingo, 7 de julho de 2013

20130707 O indivíduo e a força das ruas

O indivíduo e a força das ruas


Cada momento histórico tem modelos e características distintivas de todos os outros momentos. Muito embora possamos, com esforço de reflexão, encontrar elementos similares entre épocas pelo qual passou a humanidade.


Na Antiguidade Clássica Grega era o Universo, com toda sua perfeição, o modelo de vida do homem e da sociedade. Tudo a esse modelo se referia.


Já na Idade Média, sob os regimes monárquicos, e o domínio da Igreja Católica, Deus e o temor a ele, era o elemento determinante. Reis, Senhores Feudais e servos das glebas eram temerosos a Deus. Ou "tementes a Deus" como no nordeste brasileiro se expressa o povo ainda hoje.


Chega a Idade Moderna com as navegações. E a apropriação ou expropriação das terras dos continentes onde chegavam os europeus. Se acreditavam donos de toda civilização e colonizaram terras e mentes durante cinco séculos. Mas, voltando...


Na Europa surge o Renascimento com uma nova perspectiva: o Homem é o centro do Universo. As descobertas da Natureza, da mecânica das coisas, trouxe confiança ao homem dantes massacrado pela religião. Nasce o predomínio da Razão, algo que, de uma forma ou outra persiste até nossos dias.


No final do século passado, as mudanças tecnológicas e da geopolítica mundial trouxeram modificações sociais tão profundas que Jean-Fronçois Lyotard chamou o tempo em que vivemos de PosModernidade. Tendo seu início na década de 80 e como forte ponto referencial a Queda do Muro de Berlim (1989).


Muitos autores, de respeito todos eles, discordam da denominação dada por Lyotard, e trazem outras propostas de nomenclatura. Entre as inteligências discordantes se encontra o polonês Zygmunt Bauman, cuja denominação "Tempos Líquidos" me é bastante convincente.


Muito além do nome, Bauman trouxe à luz diversas características de nosso tempo. Destaco aqui apenas duas delas:


1. diz ele que vivemos na "Sociedade de Consumidores", onde o consumo é a mola mestra de sustentação da própria Globalização enquanto tal;


2. a emergência do indivíduo como superação de tudo quanto havia antes dos "Tempos Líquidos".


Dessa forma, com o "empoderamento" do indivíduo, ficaram para trás coisas importantes: a família apresenta novas configurações, muito diversas das vistas até as décadas de 60 e 70; o sindicalismo perde força diante da chamada flexibilização do trabalho trazida pelo Neoliberalismo; enfraquecimento dos partidos políticos; as
religiões deixam de ter importância para as pessoas. Nasce o Império do privado. A supervaloração da individualidade.


Nas leituras feitas da questão da individualidade nas obras de Bauman não me dava conta de sua força. E creio mesmo, o próprio Bauman não visualizava a "Primavera Árabe"; "Occupy Wall Street"; "Movimento 5 estrelas" da Itália; a Revolta Estudantil Chilena; e o MPL (Movimento Passe Livre) no Brasil.


Tudo isso eclode da descrença nas instituições. Nem sempre desaguando no anarquismo, mas fazendo emergir uma forte angústia, no indivíduo dos mais diferentes contextos políticos e culturais. A vida vai se tornando inaceitável. Cada dia mais inaceitável. Até que um dia chega a gota d'água. E por vinte centavos (MPL-Brasil); por umas árvores de uma praça (Egito); por acréscimo na qualidade de ensino (Chile); ou por um nada qualquer eclode um movimento capaz de levar milhões às ruas.


Agora já sem líderes. Sem Bendit. Sem Simone. Sem Sartre. Sem Angela Davis.


As massas nas ruas clamam pelo que acham justo. Se certas ou erradas. Se autônomas ou manipuladas não me interessa aqui. Seria necessário uma análise de cada caso. Não é meu escopo.


Penso no indivíduo. Hoje armado de seu celular, seu ipod, seu iphone acaba fazendo miséria. E promovendo as diversas "Revoltas dos Indivíduos".


Um contrassenso: o fato de instrumentos nascidos da "Sociedade dos Consumidores" serem as armas, usadas exatamente contra as mazelas dessa sociedade em grande parte dos casos. Pense nas manifestações contra o Neoliberalismo na Europa (Portugal; Espanha; Grécia; Itália).


O indivíduo se empoderou de si mesmo. Descobriu o seu valor, e sua força de mobilização através das redes sociais.


Nenhum dos países, cujas massas foram para a rua, poderá desconsiderá-las de hoje em diante. Isso não quer dizer, pelo menos por agora, que as massas ditarão as normas. Mas significa muito, no Brasil por exemplo, a desorientação do governo, dos políticos, sociólogos e jornalistas. Ninguém sabia como isso acontecia. E as mais dispares explicações foram por mim ouvidas.


Importa saber. Em todos os lugares onde as massas foram para as ruas, os governos estarão com um olho nas suas pesquisas de opinião, e outros dois olhos atentos às redes sociais e aos reclamos das ruas.


Afinal meu camarada Zeca Afonso tem razão:


"O povo é quem mais ordena
Dentro de ti, ó cidade."



Paulo Cesar Fernandes

07 07 2013

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