sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Inumano

Quem trouxe à luz o inumano?
Lyotard ou a sociedade do consumo?
Jacques Derrida o bordeja, mas teria chegado ali por luz própria, ou bebeu na fonte cristalina, nem sempre, de Lyotard?
Esse inumano que nada tem a ver com desumanidade, com agressividade, com tudo o que a maldade humana engendrou no transcurso do tempo.
Mas será possível à tecnologia descaracterizar o homem como homem?
Por perder sua característica maior de humanidade: a capacidade de relação social; de integração afetiva com seu semelhante?
 Vejo as ruas das grandes metrópoles mundiais com seus autômatos, a andar depressa tendo aos ouvidos seu móbil, como querem os portugueses; seu telefonino como preferem os italianos; mas seja em Milano ou em Coimbra; seja nos bairros mais afastados de nosso país há alguém a falar nesses mecanismos de comunicação.
Nem contra nem a favor me posiciono eu.
Olho de fora disto. Pois esta inumanidade me interessa apenas como elemento de análise de nosso tempo.
A Era Pos-Moderna que vem após a modernidade da razão. A modernidade de Descartes principalmente. O fundador da Era da Razão. Seu Cógito foi o monumento marco dessa nova era.
"Penso, logo existo" disse ele.
Pensa o telefonino? Pensam seus usuários, na louca corrida em busca do modelito mais pleno de recursos raramente usados?
Creio que para muitas pessoas esses mecanismos todos acabam por se postar em suas vidas adquirindo uma importância semelhante a de alguns familiares, o que não deixa de ser um fenômeno interessante.
O povo norte-americano tinha, até a década de sessenta, segundo penso, uma noção clara do valor de uso dos objetos, e por este conceito pautava suas práticas vivenciais.
Todas as atitudes careciam de razões práticas, algo que eu admirava.
Mesmo o universo do consumo era de alguma forma mais contido.
Isto se diluiu, a ponto de se perder por completo nas duas últimas décadas. E é essa nova perspectiva, que se esparrama por todo o mundo, o ocidental pelo menos.
Ao ver pessoas de baixo poder aquisitivo, de salários simplórios se preocupando e se vangloriando pela posse de tais instrumentos, passo a pensar na possibilidade dessa posse ter adquirido um valor ideológico: ideologia do consumo por certo, mas ainda assim é ideologia.
Não há racionalidade, tanto na compra como no uso. Assim como  a ideologia cristã se pautava na fé sem qualquer racionalidade, estes objetos são matéria de fé no momento atual.
Podemos afirmar que há humanidade nesta fé, pois se trata de emoção pura. Talvez mesmo pura competição.
Mas deixa de lado aspectos característicos do gênero humano.
Quem disse que esta virtualidade premente do momento atual, não acaba por substituir e realidade existencial de forma profunda? Atua como fantasia, válvula de escape. O homem não mais tem os pés vinculados ao chão, passando a dar maior valor ao virtual que ao concreto e sensorial.
Memória virtual, namoro virtual, sexo virtual em contraposição ao tato, ao olfato e ao contato. Enfim um tempo diferente, nem melhor e nem pior, apenas um tempo que se apresenta com muitos e múltiplos sinas cobrindo o espaço.

21/07/2010
Fernandes, Paulo Cesar (Keine Grenze

Nenhum comentário:

Postar um comentário